Gestão de Riscos - Construção Civil
Desde meados de 2013 o setor vem se ajustando a uma realidade diferente, e depois dos últimos balanços a necessidade de revisão dos negócios se torna necessária.
Aumento de produtividade, legalização da terceirização, desoneração da folha de pagamento, redução da informalidade, redução dos custos de construção, e combate à corrupção e sonegação exige uma revisão nas estruturas atuais das empresas do setor, sejam as grandes empresas até as Micros e Pequenas Empresas.
A reestruturação empresarial é uma consequência da evolução do setor e da necessidade de aumentar a produtividade e principalmente minimizar os riscos. Esta reestruturação não deve se resumir em práticas administrativas e técnicas, precisa ser mais abrangente com mudanças de procedimentos, de atitudes e até de alguns conceitos.
O mercado de empreendimentos imobiliários é onde as empresas operam com maior nível de riscos devido às particularidades deste mercado. Os riscos estão associados às atividades de Incorporação e Construção, o que implica uma constante gestão de riscos.
A maioria dos riscos fiscais e tributários está diretamente relacionada com a construção, além dos riscos de outras demandas previstas no Código de Defesa do Consumidor, no Código Civil, Legislação Trabalhista e aquelas relativas ao meio ambiente e segurança do trabalho.
O setor imobiliário e a construção civil necessitam de uma organização societária e contratual específica para cada produto, em função do local, da captação dos recursos, do tipo de obra, e especialmente da tributação de cada atividade e serviço envolvido. Esta organização tem como finalidade oferecer segurança jurídica e menor carga tributária possível. Por se tratar de negócios onde o ciclo operacional é longo este mercado exige estruturas sólidas e consistentes com as legislações envolvidas.
Nos últimos anos tivemos várias mudanças na legislação que exige uma reflexão para alteração dos procedimentos atuais. Muito se ouve dizer que isto ou aquilo é “pratica de mercado” ou mesmo “sempre fiz assim” ou até “todos fazem assim”. Este é o momento de mudar e rever os conceitos pré-concebidos e as práticas de mercado atuais.
Desde 2004 com entrada em vigor da Lei no. 10.833 de 2003, na área tributária, iniciou-se um processo de mudanças com o objetivo de combater a sonegação fiscal. A lei 10.833/03 representou uma pequena reforma tributária que junto com a nota fiscal eletrônica a nível nacional concretizou o processo de fiscalização eletrônica.
Em 2007 com a criação da chamada “Super Receita Federal” e ampliação da competência da Receita Federal começou a mudança na fiscalização das empresas, e em outubro de 2010 foi implantando um amplo cruzamento de dados por sistema.
Com o Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) a Receita federal vem gradativamente substituindo as informações em papel pelas informações digitais e implementando uma fiscalização mais eficiente nas empresas, não importa o porte ou a atividade.
Dentre as questões primordiais que devem ser objeto de estudo e revisão em função da reorganização empresarial para 2015, no setor da construção civil, estão as seguintes:
1 – Terceirização na construção civil
Muitas questões vêm sendo abordadas em relação ao tema, mas desde o inicio, em meados dos anos 90, foi a terceirização que propiciou a especialização da mão de obra na construção civil e só com a especialização pode ter aumento de produtividade. Com vantagens e desvantagens a terceirização tem sido inclusive objeto de discussão judicial.
Agora cabe à Corte Suprema decidir o que pode ou não pode ser terceirizado. A discussão recai sobre atividade fim e atividade meio porque não há nenhum dispositivo legal que defina o que é exatamente a atividade meio de um segmento. A grande questão é que não existe um critério capaz de definir as atividades fim e meio.
Na construção civil já há unanimidade entre os doutrinadores que o contrato de empreitada não é um contrato intuito personae, podendo o empreiteiro subempreitar os serviços da construção civil. Nos termos do art. 618 do Código Civil Brasileiro o construtor tem responsabilidade pelos vícios de construção independentemente de quem executou, seus próprios empregados ou terceirizados.
O fundamento a favor da terceirização é a própria constituição federal no artigo 170 que diz que a ordem econômica é baseada na livre iniciativa, desde que isso não vá contra a dignidade da pessoa humana nem contra os direitos previstos no artigo 7º da Carta Magna.
O ministro João Batista Brito Pereira se posicionou a favor da terceirização: “Sou favorável à terceirização, desde que a empresa prestadora dos serviços comprove a especialização para a realização dos serviços contratados\", afirmou. Na construção civil foi a terceirização que permitiu esta especialização. Proibir a terceirização agora na construção civil será um retrocesso e perda de produtividade.
1.1 Contrato de Empreitada na Construção Civil
Com a terceirização os serviços devem ser contratados com os empreiteiros. A execução de uma obra de construção civil, em geral, é realizada por várias empresas através de empreitadas ou subempreitada dos serviços. Isto acontece devido à existência de empresas especializas em atividades pertencentes ao ramo da construção, levando o proprietário a obter menores custos do que se tivesse que executar esses serviços por conta própria, já que estas empresas já possuem uma estrutura montada para executar somente estas atividades.
O contrato de empreitada da construção civil nos moldes do atual Código Civil o empreiteiro é responsável pelo serviço que executou dentro de uma obra e esta responsabilidade é delimitada no ART – Anotação de Responsabilidade Técnica.
A empreitada é a execução contratualmente estabelecida, de tarefa, de obra ou de serviço, por preço ajustado, com ou sem fornecimento de material ou uso de equipamentos, que podem ou não ser utilizados, realizada nas dependências da empresa contratante, nas de terceiros ou nas da empresa contratada, tendo como objeto um resultado pretendido e pré-determinado.
O problema consiste no serviço contratado que deverá constar no objeto do contrato, pois as obrigações assumidas decorrem do seu objeto. Tal descrição deve constar na emissão da nota fiscal de serviço. A falta da identificação clara do serviço executado nas notas fiscais de serviços vem acarretando riscos tributários e mantendo as empresas reféns da interpretação pelas fiscalizações, em especial o ISS e o INSS.
Na contratação da execução de uma obra, pressupõe entregá-la completa à contratante, ou seja, acabada, nos termos do respectivo contrato, inclusive com a utilização de máquinas, equipamentos, e materiais próprios, necessários ao seu fiel cumprimento. Quando do detalhamento das obras e de todos os serviços na área da construção civil, há de considerar tais serviços em sua globalidade, e executados mediante contratos de empreitada. Não é possível se pensar nesta atividade sem o emprego de materiais, sejam eles adquiridos diretamente pela contratante ou adquiridos pela empresa contratada e empregados na obra ou serviço.
Os maiores equívocos que neste momento exigem revisões nas práticas atuais envolvem os seguintes temas:
a) O fornecimento de material por parte do empreiteiro, faturamento direto e o equivocado “evita a bi-tributação”;
b) Contratos Preço Máximo Garantido (PMG) e os aspectos tributários.
c) Serviços com utilização de equipamentos
d) O Simples na construção civil que em geral não oferece vantagem tributária.
e) Serviços executados por uma empresa, com faturamento por várias empresas. Pode resultar em perda da garantia de obra e excesso de tributação
f) Serviços de execução de obras com pré-moldados, estruturas metálicas, sistemas de ar condicionado, colocação de esquadrias etc., que leva a uma confusão entre serviços de construção com materiais e montagens industriais tributadas pelo ICMs. Assunto já resolvido no judiciário e praticado no mercado com aumento do custo tributário e com riscos fiscais.
Jurisprudência
\"TRIBUTÁRIO - ICM - CONSTRUÇÃO CIVIL - EXECUÇÃO EM REGIME DE EMPREITADA GLOBAL - FORNECIMENTO DE PRÉ-MOLDADOS - BASE DE CÁLCULO INEXISTENTE - TRIBUTAÇÃO INDEVIDA - PRECEDENTE: RESP. 40.356-SP, D.J. DE 03.06.96.- Na construção civil, sob o regime de empreitada global, a utilização de peças pré-moldadas fabricadas pela empresa construtora, para serem montadas em edificação específica, sem comercializá-las individualmente, inexiste base de cálculo para incidência do ICM.
I - \"Prevalece nesta Corte entendimento no sentido de que, na construção civil, sob o regime de empreitada global, na utilização de peças pré-moldadas fabricadas pela empresa construtora, para serem montadas em edificação específica, sem comercializá-las individualmente, inexiste base de cálculo para incidência do ICMS\" (REsp nº 884.501/SP, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe de 18/09/2008). II - Agravo regimental improvido.
A base jurídica da argumentação é a existência de um contrato de empreitada que“não tem por objeto a venda de materiais, mas a prestação de serviços, com ou sem fornecimento de materiais a ela necessários, o qual, por sua vez é conatural ao contrato de empreitada”.
Assim, estaríamos diante de uma prestação de serviços “realizada nas dependências da empresa contratante, nas de terceiros ou nas da empresa contratada”.
A construtora contratada mediante “Contrato de Empreitada com fornecimento de materiais” que fabrica os materiais, não comercializa as placas pré-moldadas, nem estrutura metálica, nem caixilhos, portanto não é contribuinte de ICMS, sendo neste caso devido somente o ISS – Imposto Sobre Serviços de acordo com a legislação municipal do local da obra.
2. Desoneração da Folha de Pagamento
A desoneração da folha de pagamento tornou-se definitiva desde a vigência da MP 651 de 2014. A mudança tem trazido dificuldades de adaptação principalmente em relação à formação dos preços.
A folha desonerada reduz o custo da mão de obra, por outro lado o tributo substitutivo de 2% sobre a receita bruta passa a integrar o preço. A primeira questão na adaptação é entender que receita bruta nem sempre é o mesmo que faturamento e principalmente a mudança do aspecto temporal do fato gerador.
O expurgo do preço dos efeitos da desoneração em orçamentos elaborados anteriormente á medida também é um desafio, principalmente para empresas que executam obras para o setor público.
3. Diso Eletrônica e obtenção de CND de obra
A CND de obra é fundamental para o setor imobiliário e para a construção civil, o setor não sobrevive sem esta certidão, uma vez que todas as folhas de pagamento, mesmo as terceirizadas, estão vinculadas ao produto (a obra), onde as informações contidas nas notas fiscais e nas folhas de pagamento que deram origem ao serviço faturado devem identificar de forma inequívoca a obra.
A Receita Federal introduziu desde 21 de julho de 2014 a DISO ELETRÔNICA que tem como objetivo a emissão de CND de obra pela internet sem nenhum envolvimento direto da fiscalização com as construtoras e incorporadoras. Tal procedimento além de agilizar o processo também é medida de combate à corrupção. Mas exige muito mais eficiência das empresas que executam obras na emissão das notas fiscais e nas folhas de pagamento enviadas pelo sistema da Caixa Econômica que gera a Guia do Fundo de Garantida e Informação à Previdência (GFIP).
Falta de GFIP, GFIPs com erros, e notas fiscais emitidas em desacordo com a legislação estão sendo bloqueadas pelo sistema da receita federal e gerando as divergências nas informações colocando em risco as empresas que são responsáveis pela obtenção da CND e as empresas que executam obras, as empresas que mais aparecem nos relatórios da fiscalização são as aquelas optantes pelo SIMPLES.
4. Opção pelo Simples na Construção Civil
Em 2006 foi publicada a LC 123/06 que introduziu o sistema simplificado de tributação para as micros e pequenas empresas. As empresas do setor da construção civil, a partir de 2007 puderam optar pelo Simples. Nesta época a maioria das empresas do setor se situava como micro e pequenas empresas.
A partir de 2007 com o “boom imobiliário” estas empresas cresceram não enquadrando mais na sistemática. Mas, mesmo sem analisar se o Simples traz vantagem de fato para estas empresas, adotaram a prática de possuírem 3, 4 e até 5 empresas para se manterem no simples. Tal procedimento precisa urgente ser revisto, pois além de colocar em risco o contratante dos serviços, o prestador dos serviços e comprometer a emissão de CND, esta prática é muitas vezes mais cara em comparação ao lucro presumido.
A falha mais frequente é na identificação dos códigos nas GFIP da construção civil e a opção pelo anexo III que resulta em altos débitos tributários. Independente da atividade da empresa, em relação aos serviços executados em obra é obrigatório o enquadramento no anexo IV.
5. Planejamento Tributário
Considerando as alterações legais desde janeiro de 2013, com a desoneração da folha de pagamento e a redução da alíquota do RET – Regime Especial de Tributação aplicável às Incorporações Imobiliárias que adotam o regime do Patrimônio de Afetação passamos a ter dois procedimentos legais para reduzir a carga tributária das empresas do setor. Tanto envolvendo as construtoras como as incorporadoras.
Os procedimentos do Patrimônio de Afetação bem como a opção pelo RET implica em revisão de procedimentos operacionais e administrativos que devem ser revistos nas reorganizações para 2015.
Conclusão
Há quase 10 anos estamos vivendo um processo de mudanças legais, operacionais e tributárias, que vem neste momento exigir um amplo estudo baseado nas atividades do setor da construção civil, as novas tecnologias e forma de execução de obras, que devem estar coadunados com a legislação civil e tributária para uma gestão eficiente de resultados.
Escrito por Martelene Carvalhaes
Artigo publicado em Blogs Pini